Mamulengo: Patrimônio Imaterial do Brasil.

Mamulengo - Bonecos do Mundo - Aliança Comunicação e Cultura
Mamulengo: Patrimônio Imaterial do Brasil.

DE TOMBOS E TOMBAMENTOS.

Maiakovski era mestre mamulengueiro. Tanto que disse: “Melhor morrer de vodca que de tédio”. Ginu talvez dissesse diferente: “Melhor morrer de aguardente que de enfado”. Fantoche de Petersburgo ou mamulengo de Pernambuco, a experiência do boneco popular é radical. Sua irreverência, seu humor afiado em pedra de amolar faca, seu anarquismo no melhor sentido, sua incapacidade de ser politicamente correto, sua fixação em transgredir todas as leis (inclusive a da gravidade) são o seu maior patrimônio. Antítese do homem cordial, o boneco popular é do “paudório no lombório”. De paulada em paulada, ele tomba. De cachaça em cachaça, ele tomba. De rabo de saia em rabo de saia, ele tomba. Para levantar de novo, só por teimosia. “Só para cumprir com o vício”, como disse o pernambucano de Lagoa de Itaenga Mestre Zé de Vina.

Em 2015, finalmente, o Teatro de Bonecos Popular do Nordeste foi tombado pelo Iphan. “Infame?”, brincaria o finado Chico de Daniel. Porque é assim que o joão-redondo agradece. É assim que agradecem o casimiro-coco, o babau, o briguela, o mamulengo. Fazendo graça. Bagunçando o presépio até virar presepada. De pronto, a alegria pelo reconhecimento de Patrimônio Cultural do Brasil disparou a rodar pelas empanadas.

Tiridá: Tu visse, Benedito? Agora a gente é patrimônio imaterial. Eu trocava por uma casa.

Benedito: Iapôis! A gente agora é protegido do Iphan. Arrumaram um nome novo pro capeta, foi?

Simão: Rapai, cachaça derruba um cabra. Tombaram a gente.

Tem jeito melhor de celebrar que fazendo a brincadeira? Ao longo de 12 edições do Festival Bonecos do Mundo, as melhores coisas que vivemos foram em volta das barracas dos mestres mamulengueiros. Aprendemos com eles que nada é tão importante que não possa virar pilhéria. Descobrimos que é possível virar a dor pelo avesso e que seu tecido é de chita.

Entendemos, finalmente, que dá pra rir de quase tudo e gargalhar de nós mesmos. Isso salva uma pessoa, viu? Ginu, Boca Rica, Solon e Chico de Daniel salvaram muita gente. Saúba, Zé Lopes, Zé de Vina, Tonho de Pombos, Valdeck de Garanhuns e Chico Simões continuam salvando.

Desde 2004, as marionetes populares e seus mestres encantam milhões de pessoas, por todo o Brasil, no Festival Bonecos do Mundo. Acompanhadas por espetáculos teatrais de 18 países. Um legítimo intercâmbio intercontinental de linguagem. Na edição de 2016, em Goiânia e Belo Horizonte, o momento mais emocionante aconteceu na exposição em homenagem ao Mamulengo: Patrimônio Imaterial Brasileiro. Nela, o Teatro de Bonecos Popular do Nordeste foi festejado com uma rara coleção museológica, composta por mais de 250 bonecos. A maior parte deles do acervo de Magda Modesto (em memória). Enriquecida por títeres antigos da coleção de mestres vivos. Acompanhada pela oficina viva de mestres artesãos e ventríloquos.

Eita, pauperê! Foi uma festa tão bonita que, só de lembrar, já dá vontade de seguir a tradição. E tomar uma cachacinha.

Texto: Lina Rosa Vieira, diretora de Criação da Aliança Comunicação e Cultura e idealizadora do Festival Bonecos do Mundo.

Fotografia: Beto Figueiroa.

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